domingo, 6 de janeiro de 2013

Sobre ética e jornalismo, deontologia e utilitarismo

Kant


Ética e Moral


Em sua etimologia, a palavra ética vem do grego “ethos”, que pode  significar  tanto costume quanto caráter, índole natural. Conceitualmente,  segundo Costa (2009), “ética é a ciencia da conduta, que trata dos conceitos que envolvem o raciocínio prático, como o bem, a ação correta, o dever, a obrigação, a virtude, a liberdade, a racionalidade, a escolha” (p. 19).
Já a palavra moral, em sua etimologia, vem do latim “moralis”, “moris”, com ambas as expressões significando costume. Costa explica que, embora moral e ética possam ser entendidas como a mesma coisa, “a moral é restringida a sistemas  que se baseiam em noções de dever, obrigação e princípios de conduta – enquanto a ética se limita ao dito pensamento prático. (...) A ética seria como uma execução da filosofia prática, lá onde a moral estaria suspensa num mundo de normas nunca plenamente realizaveis” (p. 19-20).
Assim,  estando a o conceito de ética vinculado a  aplicação das questões morais no sentido prático, a palavra moral, por sua vez, passou a incorporar um sentido mais filosófico e até normativo acerca das condutas humanas. Costa indica que “a vulgarização operada pelo entendimento comum”  tornou possível estabelecer uma diferença entre ética e moral: enquanto a primeira encontra-se associada as normas de condutas relativas as questões do próprio indivíduo, privadas, a segunda trata das questões públicas, passíveis de serem universalizadas por uma sociedade (p. 20).
Partindo desta análise sobre a ética e moral, pode ser elaborado um questionamento básico relacionado a atividade jornalistica: Em que princípios básicos é fundamentada a moral a ser seguida pelo jornalista?  O dilema ético no jornalismo recorrentemente opõe um valor justo e bom a outro valor que, a princípio, pode ser igualmente tão justo e bom quanto o primeiro.
 Bucci (2002) indica que “a ética só existe porque a comunicação social é lugar de conflito” (pag. 10), e aponta que a ética jornalística baseia-se na busca por parâmetros que ajudem o profissional a tomar uma decisão frente a duas alternativas lícitas possíveis. Ele, então, analisa duas correntes éticas distintas, que comparecem ao estudo da imprensa a partir do ponto de vista ético: a teleologia e a deontologia.

utilitarismo e deontologia


A teleologia é baseada no utilitarismo, uma teoria moral  fundada por Jeremy Bentham e desenvolvida por Stuart Mill, segundo a qual uma ação é moralmente correta se promove o bem-estar e a felicidade para o maior número de pessoas posível. O princípio utilitarista da maior felicidade baseia-se no conceito de hedonismo, segundo o qual apenas o prazer é intrinsecamente bom e só o sofrimento é intrinsecamente mau.
Pela corrente utilitarista, o jornalista teria que calcular, dentre as alternativas possíveis, aquelas que irão trazer melhores consequências para a sociedade como um todo. O trabalho e a veiculação das informações deveriam ter maximizada sua utilidade em relação ao público. Porém, Bucci apresenta a fraqueza desta filosofia quando aplicada ao jornalismo. “Como pode um mero profissional da imprensa prever com eficácia as consequências dos seus atos? Jornalistas não são profetas” (pag. 22). Uma vez que a informação seja difundida, é impossível saber com precisão como ela será recebida pelo público.
A outra corrente analisada por Bucci, a deontologia, inspira-se na idéia do imperativo categórico de Immanuel Kant. Alvaro Valls (1994) descreve os imperativos categóricos de Kant como sendo “as formas de procedimento prático que possam ser universalizáveis, isto é, uma ação moralmente boa é aquela que pode ser universalizável, de tal modo que os princípios que eu sigo pudessem valer para todos, ou ao menos que eu pudesse querer que eles valessem para todos” (pag. 40).
Kant entendia que, como seres humano racionais, todos temos certos deveres. Alguns destes deveres são categóricos: em outras palavras, são absolutos e incondicionais para o funcionamento da sociedade como um todo. Deveres como “dizer a verdade”, “não roubar” ou “não maltratar ninguém” seriam válidos sejam quais forem as consequências que possam advir da sua obediência.
Segundo Costa, “deontologia surge especialmennte para dar sentido normativo a uma ética jornalistica” (pag. 223). Trata-se de uma corrente filosófica principista, e é exatamente por não dar espaços a relativismos que a ética deontológica pode tornar-se fraca em sua aplicação ao jornalismo.  Como decidir, por exemplo, entre publicar ou não uma matéria que possa por em risco questões de segurança nacional? Neste caso, o jornalista iria encontrar-se em um dilema ético envolvendo os imperativos categóricos de verdade e responsabilidade. Bucci explica que “ela (a ética deontológica)  não ajuda muito a decidir entre dois valores equivalentes. A outra fraqueza está em sua pretensão de ser aistórica. Não há princípios, por mais racionais  e universais que sejam, que não se modifiquem no espaço e no tempo” (pag. 23).
Bucci esclarece que não há, entre os jornalistas, nem utilitaristas puros nem deontologistas puros. “As duas correntes se mesclam, com uma sutíl incliação para aquela que prevê a responsabilidade dos agentes sobre seus atos e as consequências deles” (pag. 24). Ou seja, não há como fugir à responsabilidade, que no jornalismo se configura no dever de bem informar o público. Sobre os dilemas éticos éticos inerentes ao ofício jornalístico, Bucci afirma que não há receitas acabadas que indiquem  com resolver a todos, sendo que cada caso deve ser analisado separadamente tendo em vista suas singularidades e consequências. Ele finaliza afirmando que “qualquer debate ético adquire mais qualidade e legitimidade quando travado publicamente” (pag. 25), de forma aberta e acessível ao público. 


Referências bibliográfica


BUCCI, Eugênio. Sobre ética e imprensa. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.

COSTA, Caio Túlio. Ética, jornalismo e nova mídia. Rio de Janeiro: Zahar, 2009.

VALLS, Álvaro L. M. O que é ética. São Paulo: Brasiliense, 2008.